domingo, 25 de novembro de 2012

Burrice é não admitir que sabemos bem a fórmula da redenção!

Três dias se passaram e o concerto sobre trilhas sonoras da orquestra sinfônica de Sergipe (ORSSE) ainda repercute. Fico feliz. E respondendo aos montes de questionadores sobre porque de eu não ter escrito nada ainda, ou se ia ou não escrever. Sim, não o ia escrever, e não por algum evento que demandasse maior atenção. Não achava que fosse preciso diante de maior expressividade que o foi naquela noite. Casa cheia (Coisa rara no últimos anos nos concertos da nossa sinfônica), público imensamente animado e execuções inacreditáveis. 

E bem por isso acho que não seja necessário delongas. Essas linhas que seguem nesse post é um abraço efusivo aos músicos que ali estavam presentes. Leves, empenhados e fortuitamente geniais. O concerto foi um tapa certeiro em mim, que confesso (por questão de transferência pessoal) me sentia desestimulado a ir escutá-lo, e nunca, jamais, por não acreditar que fosse ser bom o suficiente. Desejei que o fosse, torci para que assim seguisse e não me arrependo em creditar minha nulidade pífia frente a tamanha felicidade de meus amigos na plateia. E também por isso apenas me aterei a três momentos magníficos e tentarei por apenas um post excluir da minha mente o quão ridículo é cada vez que vejo o senhor Maestro dançando daquela forma um tanto quanto constrangedora.

A lista de Shindler
1. É bem verdade que gosto demasiado do Tango Por una cabeza, é bem verdade que foi uma audição limpa, mas tão sem paixão (e ainda assim lindo, bem conduzido como me fez lembrar um amigo) que prefiro falar da preciosidade que seguiu em contra-partida com A lista de Shindler. Foi imenso, foi fantástico e arrebatador. E sem hiperbolismo algum, um dos poucos momentos que arrancou silêncio das pessoas naquela sala. Silêncio esse que presumo por mim que dialogava diretamente com os labirintos que existem dentro de cada um de nós. Tão macio e tão sofrido que a contemplação deixava um pouco invisível o solista Márcio Rodrigues (Spalla da ORSSE) para que sua alma preenchesse de poesia o mezanino donde me encontrava. Bravo.

O senhor dos anéis
2. Acho que inexoravelmente para todos nós fãs da saga Senhor dos anéis foi emocionante escutar o tema do anel e do Hobbit. O que chegou em termos de música era visivelmente empenhoso. E saboreá-lo foi ir além das estéticas concertísticas e aplaudir em cada fim de movimento (e aqui falo das outras peças em especifico). Imagino que essa ruptura não desagrade, era reflexo positivo da satisfação dos presentes. Coisa essa que também em deixa feliz e novamente reflexivo. Ora, então se tivéssemos um belo concerto como esse, menos enfadonho, mais direto a cada bimestre, não seria de algum modo pedagógico e eficiente no que tange a formação de uma plateia? O que há de popular e pejorativo (aos puros) nessas obras? Ao invés de termos que justificar que sabemos que aquelas pessoas só estavam lá por conta de referido programa e quase implorar para que voltem (que é ingenuamente óbvio que as pessoas se aproximem das salas de concertos primeiro por aquilo que lhes prende a atenção) poderíamos fazer desse momento algo natural. Não exito dizer que os dois melhores momentos do ano em termos de apreensão e participação sincera do público foram justamente os dois concertos que dialogavam com o povo. O concerto do Gonzaga e esse. Isso não é relevante? Aproveito para agradecer a meu amigo Gustavo Garcia Nogueira que atendeu a meu convite e foi ver o concerto trajando sua camisa nerd de personagens de desenho e de quebra usando o Anel do FRODO em seu pescoço. Foi divertido a beça. 

Harry Potter, Ronald Wesley e Hermione Granger
3. Ah, a Suite Harry potter! Como arrancou de mim sentimentos bons. Como nos elevou a picos tão extremos de tensão e euforia. A introdução misteriosa das trompas e o que conseguiu fazer o Daniel freire (Pianista da ORSSE)  e as cordas naqueles cinco primeiros minutos foi de arrancar lágrimas. Aos fiéis leitores de cada um daqueles extensos livros foi uma viagem homérica fundir as imagens, as lembranças de cada uma das passagens quando executadas pela orquestra. Como não lembrar da rua dos Alfeneiros nº 4 né Gustavo? Como não lamentar não ser um londrino e ter podido participar da seleção para o elenco do filme. Definitivamente escutar aquela trilha foi ficar mil vezes abobalhado e não se indispor com isso. Foi fabuloso, foi medonho de tão complexo e heroicamente tocado. Foi como renascer e aspirar bons ventos. Foi genial e por si só já valeria todo o concerto. 

E já que não conseguí não me alongar e aqui estou mesmo, aproveito para fazer duas menções. Fiquei imensamente orgulhoso de escutar com tanta firmeza e entendimento a Harpa da Thais Rabelo. Tão bom sentir que temos boas pratas em casa. Que há muito por lapidar mas que isso mesmo é indicativo que no fim teremos bom diamante. Fiquei exultante. E depois aproveito também para parabenizar o Daniel Nery. Acredite, existe menos de cenicidade e muito mais de abstração sentimental em sua condução. Para mim que sou um leigo entendedor de regências, ficou mais que claro o quanto que a firmeza dos gestos e da precisão rítmica ajudava a tornar tão bem postas as peças. 



terça-feira, 20 de novembro de 2012

De quando é divertido brincar de achar que o público não sabe o que é uma mudança abrupta. Ou da série: Nunca quis tanto ir a um concerto! E de verdade, ainda que digam o contrário, desejo que seja uma noite e tanto. Até convidei um amigo.

Imagino pra mim mesmo que esse hiato que me separou do último post tenha me feito ver as casas reais muito mais próximas à sua real conceptura. Vi diante de mim tantas e tantas posições. Fraquezas, medo, discordância, atrocidades com a arte musical aqui em Sergipe Del Rey. E o mais bonito de toda essa nuance é que ela acontece quase que sorrateira, como um ladrão que se precipita para dentro de nosso jardim e rouba a rosa preferida como se também não antevisse que o dono do jardim, mesmo que tarde, uma hora fosse proteger-se. E pra isso não precisa que haja muros, nem grades e cercas elétricas. Meu silêncio em nada é recuo. Ao contrário. O tempo de silenciar me recompõe para que eu escreva sobre e quando quiser. E não há como não sê-lo.  Hoje por exemplo, o instinto pulsa mais que no inicio deste blog. E descreverei com clareza o que faz deste post tão contraditório e difícil de sair.

A questão que rodeia minha cabeça por tanto tempo é a seguinte: Até que ponto nós sergipanos como público somos tão inocentes em relação aos mandos e desmandos gerenciais que permeiam nossa cultura sem que nos importemos, sem que de fato entendamos que todas as questões, inclusive as relações pessoais nesse sentido, sejam políticas? Isso tudo para que eu responda a mim mesmo que ainda vai levar algumas eternidades para que alguém se disponha a por fim no quesito "brincar de orquestra de nível internacional". Sim, porque se o discurso hierárquico é de que agora temos uma das orquestras mais atuantes do eixo norte e nordeste, vamos começar fazer jus à clarividência. Consigo compreender que a ORSSE tenha dado um salto, e já evidenciei aqui em outro momento. Mas não consigo compreender como ao mesmo tempo em que temos a possibilidade de ir adiante à transformação, insistimos em ficar no meio do caminho. E nisso credito a culpa diretamente a duas pessoas. A primeira, da secretária da cultura (na pessoa da SECULT) que parece fechar os olhos para o que é tão óbvio. Se hoje logramos o status de uma das orquestras mais atuantes do norte e nordeste é porque o compramos em duas perspectivas. A primeira, da veiculação do discurso, que apesar de ser questionável em termos técnicos, é de função nossa vendermos os produtos do estado (ainda que esse, não dialogue em nada com nossas raízes, nossos desejos, nossa identidade), a segunda no sentido de que não é preciso ser muito entendido em termos licitatórios para compreender que pagamos e pagamos muito caro para fingir que somos boa orquestra frente a regentes de renome nacional e internacional (que claro, não dispensariam por pouca bagatela um "convite" nosso). O segundo culpado, e o digo sem medo que me coma o fígado (afinal, só resta um e antes que ele acabe preciso escrever) sem sombra de dúvidas é o maestro Guilherme Mannis. 

Já falei aqui antes e repito com desejo de que soe e ressoe minha indignação frente à falta de respeito com que esse senhor conduz a nossa orquestra. Não é a primeira vez só nessa temporada que eu falo explicitamente da falta de respeito que existe por parte da direção no sentido de mudar um repertório, cancelá-lo ou qualquer coisa nesse sentido. Não existe coisa mais depreciativa que se encher de expectativa diante de um repertório e então dar de cara com um recorte bonito do que fora vinculado antes. Por exemplo:  22 de novembro de 2012... Onde foi parar O Patriota, ET, Pearl Harbour, Superman, Jurassic Park...? Certamente juntaram-se a Petrouscka. 

E por isso explico aqui meu pesar do primeiro parágrafo. Não desgosto menos o repertório que está posto para a quinta-feira dia 22 de novembro de 2012. Vai ser incrível, desejo que o seja, e fico feliz que trilhas como a do filme Jurassic Park esteja efetivamente de fora das execuções. Estou feliz, excitado e tão empolgado a ponto de convidar amigos para que vão ao concerto. É meu dever como mantenedor da orquestra, assim como também é meu dever que eu não me cale só porque o repertório favorece meu ego. Como também é meu dever supor entender que mais uma vez volto à questão de escolha do repertório como um atavio à nossas necessidades. É sobremaneira uma escolha elitista, que só dialoga com uma parcela mínima das pessoas que irão ao teatro. Cadê o espaço para a musica nacional? Onde ficou a sapiência entre mesclar bons repertórios de cinema mundial ao invés de trazer quase que um concerto inteiro alusivo à obra do Johnn Williams? Muito me espanta que nessa noite em que vamos falar de cinema não exista sombra alguma  do mestre Italiano Ennio Morricone e seu fabuloso Cinema Paradiso.

E ainda que o concerto não seja mais em comemoração ao aniversário de 150 anos do Debussy, vamos lá. Bom concerto.

Orquestra Sinfônica de Sergipe - Série Cajueiros IX
22 de novembro de 2012, 20h30
Teatro Tobias Barreto
Ingressos: R$20,00 (inteira), R$10,00 (meia)


"Cine Orquestra - Grandes Trilhas Sonoras do Cinema Mundial"
Daniel NERY e Guilherme MANNIS, regentes
Márcio RODRIGUES, violino

John WILLIAMS
Raiders March - Indiana Jones e os Caçadores da Arca Perdida
Super Man March - Super-Homem
Suíte Star Wars
A Lista de Schindler
Suíte Sinfônica de Harry Potter e a Pedra Filosofal

Carlos GARDEL
Por una cabeza - Perfume de Mulher

Howard SHORE (Arr. Bob Cerulli)
Senhor dos Anéis - A Sociedade do Anel

Klaus BADELT (Arr. Ted Ricketts)
Piratas do Caribe - A Maldição do Pérola Negra  

Fonte: http://www.orquestrasinfonica.se.gov.br/temporada
          http://sinfonicasergipe.blogspot.com.br/

quinta-feira, 1 de novembro de 2012

De quando um menino maluquinho compõe trilha para cinema como gente grande!

Antônio Pinto
Faz tempo queria falar sobre trilha sonora. A bem da verdade se existe fagulha em mim de desejo de ir além com a música é dentro dessa perspectiva. Acho que fui tragado nesse meu afã cinéfilo muito antes pela música que pela composição dos enquadramentos e da decoupage dos filmes. Lembro quando na classe de 2008 de cinema (Patrocinadas pelo Minc (Ministério da cultura) e pela rede Olhar Brasil) da qual fui um dos anualmente 25 selecionados e numa das disciplinas discutíamos os efeitos da trilha sonora como composição de narrativa e espaço de subjetividades. Tópico esse que me excitava deveras, mas que a um colega de classe era explicitamente entorpecente. Recobro a lembrança de ele me explicar que achava em geral que a música acabava na maioria das vezes tendenciando a narrativa das imagens e que dramatizava sobre maneira o que poderia ser contado em silêncio e teria efeito mais profundo. Me recomendou inclusive um artigo do professor Ismail Xavier ( Professor da ECA-Escola de comunicação e Artes de São Paulo  ) que relutei a ler de inicio já que antevia alguma crítica no sentido de anular minhas perspectivas cinematográficas diante da construção do que eu cria, mas que depois degustei sem sobressaltos uma de suas obras mais completas sobre cinema:  O Discurso cinematográfico: a opacidade e a transparência. E foi um tapa, ou a bem da verdade o recomeço para que eu visse também outro caminho e redescobrisse o cinema mudo. 

E deveria me alongar aqui falando sobre a experiência de estudar de maneira analítica as composições para cinema, ou de como elas tem efeito substancial sobre a construção de uma narrativa. De como esse campo que no Brasil ainda engatinha tem grande espaço e grandes colaboradores desconhecidos da grande mídia. Mas o que me toma a escrever nesse espaço, hoje, é algo mais simples e substancial. A lembrança doce de como ainda criança no ano de 1998 conheci o que  desconhecia como trilha, mas que me usurpou o sentido de estar frente a televisão combinando imagem e som, e já aos poucos entendendo quando a música contava mais que a imagem em si. Foi ai que conheci também o Antônio Pinto, mas que só o fui revisitar com madurez mais tarde. Ao assistir o filme brasileiro Central do Brasil, dirigido pelo também brasileiro Walter Salles, me senti anestesiado pela seleção das canções e de quando a composição erudita atravancava as cenas dando a elas um peso cênico que eu jamais imaginava que se pudesse com tanta beleza.

"A parceria entre o cineasta e o compositor começou em 1995, quando Antonio criou a música para o curta-metragem Socorro Nobre e para o longa Terra estrangeira, codirigido por Daniela Thomas, irmã de Antonio. Em 1998, compôs, ao lado de Jacques Morelenbaum, os temas de Central do Brasil, filme que correu o mundo e teve duas indicações ao Oscar. Filho do cartunista Ziraldo, Antônio também é o compositor da trilha de Cidade de Deus (2002), de Fernando Meirelles, em parceria com Ed Cortês. Em 2004, deu início aos trabalhos internacionais: a trilha adicional do longa-metragem americano Colateral, de Michael Mann, protagonizado por Tom Cruise, e a trilha de Crônicas, de Sebastián Cordero, uma coprodução entre México e Equador. Foi indicado ao Globo de Ouro pela música original Despedida, composição sua, com letra e interpretação de Shakira, para o filme O amor nos tempos do cólera (Love in the Time of Cholera) (2007), de Mike Newell. Sócio-diretor da produtora Supersônica, é um dos poucos músicos brasileiros efetivamente especializados em trilhas sonoras para cinema."



É incrível o poder descritivo de suas trilhas e por isso o igualo ao meu favorito compositor para cinema, o espanhol Alberto Iglesias, que tanto colabora com os filmes do também espanhol e cineasta Pedro Almodóvar. Ao criar uma peça, ele recria a leveza de contar a história e por isso não consigo arrancar de minhas referência a passagem do filme Central do Brasil em que a personagem Dora, interpretada pela atriz Fernanda Montenegro, decide ir embora e que o Antonio Pinto escreve uma apoteose para pintar essa despedida. Sozinha e em silêncio Dora se despede de um pedaço de sua vida, algo que conquistou no susto e imprevisivelmente fez morada em sua pele, e não menos avassalador é sentir que essa despedida só tem  sentido se colocada frente à canção escrita por Antonio e que se chama A carta. A depressão dolorida da certeza da finitude marcada pela melodia e harmonia dos violinos, o choro contido no soluço da colaboração na trilha do violoncelista Jaques Morelembaum e o conjunto de qualidades dentro da simplicidade com que vejo ter sido escrita, quase que de forma experimental essa trilha me faz desejar que mais pessoas possam ter acesso a sua obra. 


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