O dia de ontem foi feliz por duas grandes apresentações de piano na cidade do Rio de Janeiro. Ao meio dia e meio no CCBB dentro das programações do importante projeto Música no Museu pude ver o jovem Pianista e compositor Paulo Francisco Paes, já a noite no espaço BNDES às 19h o prestigiado Arthur Moreira Lima. Dois espetáculos grandiosos e inteiramente gratuitos que dentro de características distintas nos aprisionam a vê-los. E assim o foi.
Embora eu tenha rabiscado inúmeros pontos a partilhá-los aqui, decidi de última hora e como um sopro no ouvido que não me deixou ir por outro caminho, escrever sobre o que mais me prendeu. E se eu pudesse classificar a apresentação do Paulo Francisco, diria que foi como repousar sobre a possibilidade de mergulhar num quadro de imagens fortes ainda que as tintas fossem as mais claras na tela. Não o conhecia, confesso. De Aracaju quase não se pode ver o mundo ainda que a internet seja uma explosão de informações e novidades. Daí a importância de sempre e quando sair em busca de novos ares, como me propus agora estas duas semanas.
O jovem pianista já é bem conhecido por aqui e também já bastante laureado com premiações por todas as partes. Nada que seja maior em sua biografia do que o ar sereno com o qual mostra que identidade musical nada tem a ver com o corpo que se move frente ao instrumento. Mas que ir além na interpretação de determinada obra é o diferencial que impulsiona o êxtase da arte. Ao vê-lo em cena é como não esperar nada além de talento, mas ao escutar as primeiras notas de seu som, é sentir-se como entrando num vagão, feito o do Villa, e ser levado aos altos picos da montanha para de lá ver quão grandes possibilidades de frio na barriga se pode ter ao segurar a mão de um desconhecido.
Paulo Francisco Paes - Pianista |
Ao executar Fragmentos, e Naquela Tarde, sentia-me como vagando por um imenso corredor de muitas portas em busca de uma que me libertasse para o mar, tudo isso numa cadência misteriosa de ataques rígidos e de cinismo musical recorrentes nos filmes não comerciais. Ao me precipitar por cada porta, levado pelo martelar ora forte, ora delicado do piano, não antevia a facilidade que era girar a maçaneta e entender que lá fora, com o brilho do dia eu podia sentar-me à beira da fonte e escutar o canto dos pássaros. Era como ir-se, descortinando a natureza à medida que Paulo, no auto de seus 30 anos e recém regressado de uma temporada de estudos na Espanha, encheu de maturidade e ternura a Música no Museu.
De forma que vale a recomendação de alguns minutos de beleza e engenhosidade aos que se deixarem tomar pela mão num passeio até o alto da colina e conhecer os prodígios de um cd que inspira e diz muito sobre o novo olhar musical autoral no Brasil. Mais jovem, valente e ainda cheio dos mesmo velhos sentimentos de ondas do mar. De lá, a imagem é tua e não importa como as pinte, certamente os tons serão de alvorada.