segunda-feira, 5 de agosto de 2013

Intrigante ver a mudança de discurso e a defesa de um programa que mescle popular com o erudito para agradar o público, ou de quando de uns tempos pra cá abrir as pernas (no sentido literal, claro, já que ainda mantenho uma relação pudica com as palavras) não requer o menor pudor!

Todo esse ácido para dizer que me sinto feliz (embora discorde ideologicamente das rupturas abruptamente escancaradas que menos tem a ver com intenções reais de popularizar-se por entender a necessidade de que a arte deva emanar do povo para o povo) de que haja uma tentativa interessante de levar à orquestra ao ponto de onde ela partiu. E quando digo isso, não é de longe uma defesa escancarada postulada sobre a égide da antiga direção artística da Orquestra Sinfônica de Sergipe ORSSE, não! No entanto hemos de convir que nos últimos anos a nossa orquestra tenha declinado em termos de popularidade. Passou da casa cheia ao mezanino às moscas e isso objetivamente reflete não a qualidade técnica do conjunto de músicos e maestro, não é isso que se deve questionar nessa perspectiva, mas sim, a maturidade artística de entender a necessidade local de cada povoamento e suas referências de arte.

Já postulei inúmeras vezes que não defendo o afastamento dos cânones musicais dos programas mensais, nem de longe seria sensato já que a pluralidade de compositores e estilos nos empurra pragmaticamente para a audição de potências como Mahler, Mozart, Dvorak, Villa Lobos, Beethoven, Vivaldi, Saint Saens e é sem dúvidas um deleite escutá-los de perto, de vê-los reinterpretados debaixo de nossa arena Tobiense. O que tange minhas predileções e que se firma evidente diante de todos aqueles que não injustamente se oportunizam refletir, é o fato de que o público sergipano aos poucos vem amadurecendo suas escolhas, defendendo de maneira mais intensa a construção de uma nova realidade que se perdeu quando o Lamentavelmente o Maestro Guilherme Mannis assumiu a direção artística da ORSSE e a transformou num infinito particular, infinitamente alheio a tudo que fora construído para melhorar a compreensão do público sobre o acercamento possível através de um tipo de música que nos retratasse ,de uma arte que por muito tempo em Sergipe se restringiu às aristocracias falidas e que finalmente abria espaço para que pobres, leigos, endinheirados, brancos, viados e putas pudessem compartir o mesmo espaço de audição e tivesse a acesso a um tipo de identificação que ultrapassava as barreiras do que pode ou não pode. Porque a música era o único elo, e universalmente os colocava como um só. 

Entendo a diversidade de condução, compreendo sem injustiças a importância de afastar-se de sombras do que é passado e fazer-se novo.  E em sendo o maestro Guilherme Mannis não mudaria mesmo em  nada em minha perspectiva de condução. Porque estou arraigado ao que acredito e vou até o fim defendendo o que julgo ser correto para mim ainda que todos a minha volta me mostre os equívocos. É parte do que somos defender o que acreditamos, é quando nos destacamos da multidão custe o que custar.  Mas existe nessa possibilidade um grande abismo, e é justamente nele que vejo mergulhado as escolhas administrativas que toma para si nosso maestro. E o abismo se representa na incapacidade de reconhecer que somos autônomos para perceber as mudanças forçadas, os discursos que não se sustentam sozinhos diante das predileções diretivas de um programa a outro, ou de que não conseguimos fazer sozinhos uma retrospectiva estética e perceber que sim, avançamos, mas não avançamos com a alma, não avançamos de maneira a naturalizar o espaço significativo que pode ter a música popular dentro de um espaço erudito. E justamente por isso me paraliso toda vez em que nos últimos meses a fio, mesmo à distância do Brasil, vejo muito mais defesas discursivas do que mudanças pragmáticas. Louvo e parabenizo os espaços que vem se colocando, até por entendê-los (sem arrogância) como pautas de reivindicação, e repudio amargamente a ideologia em trânsito, como que perdida na própria nulidade de não ir até o fim com o que deveria ser marca única de um projeto diretivo. 

A quem puder lembrar, Villa Lobos foi execrado por inúmeros segmentos por sua associação à francesa com o governo getulista que lhe provia de promoção em troca de escancaradas associações publicitárias ao seu governo. Oportunismo, burrice, egoismo ou pobreza ideológica? Certamente. Mas também a possibilidade de o termos como um dos maiores, quiça o maior da música erudita em toda a América. Karajan ou Bernstain: deliciosamente despóticos, eu sei. Tangíveis a qualquer consciência dotada de humanidade, e ainda assim, não há que vá de encontro ao fato de que havia sensibilidade estética em suas durezas de espirito. E que vê-los conduzir é como parar no tempo e anular qualquer informação de bastidor para vivenciar no palco a alma despida de pudor. O que há de comum em tudo isso é justamente o feito de não abrir mão de si para construir-se como queria o outro. Porque existe a possibilidade de não mudarmos nossas perspectivas, quando assumimos com tranquilidade a qualidade essencial de ser aquilo que acreditamos ser possível até o fim. E quem em percebendo a mudança, ela venha tranquila como um processo e não imposta como a vejo em programas como o desta quinta-feira 8 de Agosto de 2013 :

Serie Mangabeiras III
Brasil Sinfônico
Leonardo DAVID, regente convidado
Marco PEREIRA, violão
Marco PEREIRA
Violão Vadio
Suíte das Águas
Círculo dos amantes
Jean SIBELIUS
Sinfonia nº2, op.43, em ré maior
Quando:
08 de agosto de 2013, 20h30
Onde:
Teatro Tobias Barreto
Quanto:
R$ 20 (inteira)
R$ 10 (meia)



12 comentários:

  1. Gostei da temática. Essas postagens que pensam a música também como ato político me fascinam, embora eu ache que você deveria enxugar mais o texto e dividi-lo em mais parágrafos. Eu apesar de ser amante tanto da música quanto da literatura às vezes me vejo um pouco enfadado de textos longos sobre temas que não domino.
    À parte isso, que bom que mesmo afastado de terras tupiniquins você continua antenado do que rola por cá. Aliás, mais antenado do que a maioria da população sergipana, que ainda entende a ORSSE como algo longínquo de sua realidade.

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  2. "uma arte que por muito tempo em Sergipe se restringiu às aristocracias falidas e que finalmente abria espaço para que pobres, leigos, endinheirados, brancos, viados e putas " Tenho uma uma coisa a dizer: kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk.

    Gostei do texto, Parabéns por um anos de luta a favor da mudança. Tenho certeza algumas apresentações mais populares que ocorreram foi uma resposta, mesmo que forçada, as críticas recebidas. Quem sabe um dia essa consciência seja natural.

    Abraço.

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  3. Interessante, que ao ler o texto eu associe a obrigatoriedade da escolha, com a nossa obrigatoriedade de escolher o que nos é mandado. Muito bom texto, um desabafo. Gostei! <3

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  4. Gosto de ver a tentativa de adequação ao público equilibrada à manutenção das tradições, por assim dizer. Mesmo que possivelmente não seja do modo mais genuíno e eficaz. Acredito que são passos trôpegos rumo ao ideal - talvez inatingível - dessa arte para o povo. Um brinde à música, que nos faz dançar conforme seu andamento e impõe seu ritmo em algum momento de nossas vidas.

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  5. Quantas reflexões inebriantes. Fico feliz que aos poucos, ou quiça ainda timidamente o trabalho da formiga seja importante de quando necessitar ver no caminho a cigarra cantando no frio.

    1. Estou de pleno acordo Geografia na Luta, mas acredite, isso é parte de mim e toda vez que tento moldar e simplificar fico entediado. Meu primo Anderson me fez a mesma crítica inbox. Disse-me que critico a aristocracia falida mas escrevo como ela. Será então que também este espaço não é um retrocesso?

    2. Anderson: por mais engraçado que pareça, no fundo é isso aí mesmo. A música não deve ser rotulada nem como popular nem como erudita, nem como boa ou ruim, e pior: música de negro, música de bixa, de baixa renda ou da burguesia. Arte é apenas manifestação.

    3. Luara, eu fico sem saber ao certo o que pensar quando me deparo com a dura reflexão de suas palavras. Será que no fundo também nós não somos os suseranos?

    4. Thirza, esse contraponto que apresentas toda vez em que cres que mesmo má intencionadas as ações, ainda assim o resultado é o mais importante eu também partilho. O problema é que sabemos bem o reflexo desses resultados, e são sempre os mesmos.

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  6. A beleza, a licenciosidade e a docilidade de suas palavras me fascinam. Mas, apesar de amar suas belas palavras e até concordar com a maioria delas. Acho interessante ter no estado uma orquestra que toque os clássicos e claro que isso não deve excluir a música do povo das salas de concertos. Acho necessário que todas as pessoas tenham o simples direito de ter contato com todo o tipo de música.

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  7. Lidiane, se você ler outros posts vai perceber que é exatamente isso que o blog defende! tocar não só o clássico como também o popular! O problema é que a ORSE está excessivamente focada em música clássica. Quem costuma assistir as apresentações pode perceber isso, uma das poucas vezes que tocou algo popular, como por exemplo temas de cinema, foi casa cheia, como há muito tempo não se via. Grande parte das pessoas do nosso estado não estão acostumadas (sempre há exceções) a ouvir tchaikovsky, mahler, beethoven, piazzolla, e outros grandes compositores; elas estão acostumadas é com Pablo, aviões do forró, e outros arrochas da vida. Se quiser conquistar a atenção dessas pessoas é primeiro preciso atrair com o popular, para poder acabar com paradigmas, e então apresentar o clássico! essa é a proposta do blog, abir os olhos das pessoas responsáveis que tem o poder de mudar isso.

    Jonas, sei que escrever assim é algo seu, seu jeito de ser, é até de se ler, mas admito que tenho que pesquisar algumas palavras que não entendo ( se não fosse o corretor ortográfico haveriam alguns erros aqui, kkkkk, sabe que tenho dificuldades com ortografia! kkkkkkkk não domino as palavras da mesma maneira que você.

    Grande abraço seu puto

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  8. Desculpe, gente: mas o que seria mesmo essa música do povo? A música que a massa (mais uma vez, generalizo também) está acostumada a ouvir? Porque se for, também concordo que não há espaço para ela em meio à Orquestra - não no momento. E imagina se estudantes de música não concordariam com isso. Mas lembremos que mesmo dentre os compositores tidos como eruditos, alguns são mais "fáceis" de serem ouvidos. E até executados, rs. Você bem sabe, Lindiane, que a maioria dos ouvidos leigos se agrada mais de Mozart que de Schoenberg.

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  9. Agoraaaaa, me parece que depois de tantos e tantos posts, isso sim é o suscitar de uma discussão importante! Anderson e Lindiane tocaram a bola para Thirza fazer o gol e é tudo mesmo isso um pouco. O que está em questão de fato deve mesmo ser esse tipo de música popular. Ora, esta semana aqui em Arequipa pude presenciar um grupo de 18 violões Alemães tocando desde a suit Carmen do Bizet, o Estudo 12 do Villa e por fim uma Marinera: música popular folclórica peruana. É disso que falamos o tempo todo, fazer uma ponte entre a arte erudita de compor melodias e harmonias atrelada a manutenção das bases culturais e melódicas de um povo. A marinera foi intrinsecamente erudita, porque a forma como foi conduzida nos permitia perceber isso. De modo a fazer com que a população um pouco mais distante da realidade das orquestras possam perceber a pluralidade de possibilidades estéticas. Já que quiçá eu tenha sido pouco entendido, ratifico mais uma vez que este post não é uma desaprovação às mudanças que temos visto, que são necessárias e que tanto pleiteio aqui neste espaço. Mas o que questiono é o limite entre a mudança forçada e a mudança ideológica. Tão pouco quero um arranjo sinfônico sobre temas do cantor apaixonado...

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  10. Eu, artilheira! Quem diria, hehe. :P
    Agora: "arranjo sinfônico sobre temas do compositor apaixonado"... Eu ri, viu? Melhor nem imaginar. Vai que, né?

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  11. Sei lá, tudo é possível, vai que eu gosto? kkkkkkkkk

    "Mas pode ir
    E vá com a certeza de que quem perdeu não foi você
    Prefiro me acabar nesse vazio
    Do que te fazer sofrer
    Do que te ver chorar, pagar
    Por meus enganos"

    Até combina com a atual situação da ORSE
    kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk

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  12. Gente, agora falando sério. Eu não acredito que esse tipo de música que vocês mencionaram seja música do povo, eu entendo a música do povo como algo que forme uma identidade do grupo. Entendendo identidade como a sensação de pertencimento que se constrói ao longo do tempo. Na opinião de Behágue a música, como uma forma de comunicação não verbal, é, talvez, a mais alta expressão estruturada do comportamento humano e uma das mais poderosas ferramentas de autodeclaração e autoconsciência na relação da visão de mundo de um dado grupo social.Na literatura as abordagens teóricas sobre identidade musical reconhecem que a música possui um forte significado social. Por esta razão existe um entendimento de que as questões da identidade musical estão intimamente ligadas às questões da identidade humana, visto que a música é capaz de refletir padrões culturais e estruturas sociais.

    Quanto a esse tipo de música eu só consigo enxergar os sinais de uma sociedade 'doente emocionalmente' . Visto que vivemos em um tempo que nutre o desenvolvimento das ciências e tecnologias, que fez o homem parar de olhar para si, para seus anseios. O homem moderno busca no consumismo e na diversão uma razão para a existência. Criando uma enorme crise de sensibilidade que é manifesta nesse tipo de música, música para consumo e diversão.

    Essa é minha opinião...

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