domingo, 23 de dezembro de 2012

Hoje é natal, deveria falar sobre música natalina ou posso dizer que demorei a escrever sobre a Nona do Beethoven por medo de não conseguir calar o que meus ouvidos escutaram? Embora eu saiba a resposta, prefiro dizer que Ver o Jackson Trindade cantando com o coro da ORSSE foi grandioso.

E vou logo adiantando que não há tanto assim por dizer. E talvez justamente por ter sido um tanto quanto enfadonho pra mim estar lá escutando pela terceira vez a tal 9ª sinfonia do Beethoven em ré menor op. 125. E claro que me importo em lembrar a primeira vez que a escutei justamente de quando se deu a inauguração do Coro sinfônico sob a direção do Pianista sergipano Daniel Freire. Era 2005, era outra ORSSE, ainda engatinhava no sentido de se firmar como orquestra depois de tantos anos de atividades engodísticas. O maestro Ion Bressan então a frente da Sinfônica, deu à orquestra a brilhante oportunidade de executar peças importantes do repertório operístico mundial sem o constrangimento de ter que descartar da seleção obras que objetivamente só poderiam ser tocadas acompanhadas de um coro sinfônico, a exemplo da Nona de Beethoven. Foi grandioso para mim que até então só concebia tal ideia através dos canais fechados e por isso fiz questão de escutá-la novamente em 2009, já sob a direção do mesmo Guilherme Mannis que volta com ela três anos depois.

E apesar de o motivo maior de eu ter ido lá ter sido o depois do concerto, a programação nocturna que saiu pela colatra, engenhosamente o Concerto foi quem salvou meu dia. Endosso que jamais imaginaria que seria positivo ao ponto em que me foi quando saí de casa. E ainda assim me dispus a assistí-lo sem reservas. E ainda assim prometi manter meus ouvidos abertos para o que chagaria até o mezanino. E chegou tão presencial em termos de sonoridade que falar das ressalvas será um tanto quanto pesado.

As cordas, todo o conjunto delas estava bem posto, emoldurado numa sincronia que não é comum nas apresentações últimas da ORSSE. E embora eu deva dizer que gostei sobre maneira da execução dos violinos, de como eles flutuavam bem dinâmicos ( sobre maneira no Scherzo), o que mais me arrebatou e suponho que tenha intimidado a muitos (que sentados ali) sabem bem a real capacidade técnica das cordas mais graves, foi justamente o conjunto de Cellos, Violas e Contra-baixos. Faz tempo e venho elogiando a chefe de NIPE/NAIPE (afinal o que importa mesmo é a semântica das palavras) dos Cellos, Andressa Souto e não só pela capacidade técnica, a desenvoltura com a qual visivelmente consegue amaciar os trechos mais complicados da obra, mas também pela capacidade de chefiar o seu grupo com sabedoria. Vide o fato de ter posto seu pupilo (que atua como estagiário) mas que sem dúvidas tem despontado como uma das grandes promessas dentre alguns anos, ou quiçá já o seja, na última estante fazendo com que o som nos parecesse muito mais cheio do que de costume. Gosto demasiado do grupo de Baixos, eles conseguem ser lineares (no sentido positivo) e me fazer passar algu tempo vidrado na dinâmica de suas arcadas e dos ataques que sempre me parecem mais ferozes que os de qualquer outro grupo. Nesse sentido também louvo os louros ao Jair Maciel que comanda tão sereno os sons mais graves fazendo com que eles sejam vistos. E parabenizo-o também por encabeçar tão brilhantemente a criação da Orquestra sergipana de Contra-Baixos (OSCON) a quem justamente devo um espaço merecido mais a frente neste blog . Já as violas, a quem já elogiei anteriormente mas que últimamente parece ir-se afogando em marasmos (e embora eu não seja tacanho de perceber também as transições pelas quais esse naipe tem pasado), neste concerto parecia existir. Parecia que consegue ir além dos enxertos de toda vez e criar autonomia. Foi de lá que saiu em minha opinião a maior parte da beleza do 4º movimento, o que torna significativo eu tê-los aplaudido com tanta verdade.

Vergonhoso mesmo, e no sentido mais lastimável foi sentir a ausência de madeiras. Foi tão vexatório que finalmente me despi de meu polimento de todas as vezes em que quis falar sobre esse grupo em geral e acabei ponderando meu apreço pessoal por alguns músicos. Hoje não pode ser assim, por que me incomodou deveras e tanto a ponto de me fazer não querer estar lá presenciando-os. A verdade é que todas as madeiras sairam juntas e antecipadamente de férias. E justamente com polimento vou me ater à percepção de que tudo pareceu confuso, embolado e tão sem sem fôlego que o ar que faltou deles por pouco não conseguiu tirar o brilho soberbo das cordas dando vazão ao coro.

E é justamente falando do coro que terminarei. E também para justificar a retrospectiva que fiz no primeiro parágrafo. Fiquei exultante justamente por evidenciar que se por um lado as madeiras resolveram sair de férias, em seu lugar apareceu um coro sinfônico que não conhecia. Faz uns três concertos passados que falo sobre o potencial do coro, que a pesar de sua pequena estrutura de membros, tem evoluido e reverberado mesmo que com a quantidade minima possível para boas apresentações, mas o que eles apresentaram no Beethoven foi magnífico. foi comovente e fortuitamnet prazeroso ficar ali. Foram maiores em tudo, muito maiores até que o único solista que se salvou em termos de expressão na noite de quinta. Juntos, Coro e o Baixo Cláudio Alexandre fizeram da noite um bálsamo. Foi portentoso escutar inclusive a região aguda do coro que sempre me desagrada, e esplendoroso vê-los uníssono e tão bem encorpados como imagino que seja característica importante dessa sinfonia em especial. Prova de que o canto é algo ainda a ser descoberto pela nossa orquestra, o canto que vem de dentro do coro e pode ecoar como agora o faz Cláudio Alexandre. Mas que para serem vistos é preciso que se ponham a prova e apanhem como foi no choros nº 10 do Villa Lobos, mas que se levantem quando mesmo em menor quantidade e desacreditados dos investimentos e incentivos, possam fazer com que o instrumento voz seja a prata da casa num concerto cheio de surpresas agradáveis.


3 comentários:

  1. A Orsse já descobriu o canto. Talvez exista um equívoco sobre quem brilha mais. Só sei que juntos a emoção é maior. Cada apresentação do coro é um suspense, um grupo ainda sem estrutura. Mas ser artista é mesmo incrível, o concerto foi magnífico.

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  2. Então fico feliz e embora eu discorde o fato de já terem sido descobertos: no sentido da perspectiva de incentivos e valorização para atrair mais coralistas e imprimir uma qualidade estável, já fico feliz que mesmo em menor quantidade consigam fazer frente à guerra, de quando necessário o enfrentamento.

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  3. O que impede investimentos no coro sinfônico talvez seja uma mera disputa por 'aplausos', viagens, diárias, cc's e etc., penso eu na minha infinita ingenuidade. Faz algum tempo que o público valoriza apresentações da orsse com o coro. Até que a UFS oferte um curso de canto vai demorar... Enquanto isso, muitos cantores sergipanos, amadores e profissionais formados em outras praças, estão somente na platéia. O que a Secult está esperando?
    Viver é um jogo de máscaras, e neste jogo o mais importante é a imagem. Ainda bem que a imagem que tivemos no palco foi boa. Recompensa quem assiste e quem realiza.

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