O concerto da Orquestra sinfônica de Sergipe (ORSSE) do dia 05 de julho se
pretendia em sua primeira parte ser uma homenagem ao escritor e jurista
sergipano Tobias Barreto de Meneses e não conseguiu transportar em sua música
mais que desconforto e agonia. Encomendada pela ORSSE ao compositor e fagotista
Cláudio de Freitas, a obra estava
dividida em quatro momentos, cada um baseado num poema do literato sergipano
lançadas em 1893 no livro chamado Dias e noites.
E a maior inconformidade foi não conseguir
reconhecer nenhum traço sincero das características da escrita de Barreto nas
músicas. A escolha dos poemas foi incrível: “Cena sergipana”, “Penso em ti”,
“Gênio da humanidade” e “Que mimo”. A voz e o esforço rascante do baixo
paulista Carlos Eduardo Marcos foi sublime e uma dádiva a parte, muito embora a
poesia melódica das quatro canções sobre os poemas diz pouco sobre a escola
literária a qual Tobias fazia parte. Ou sobre a verdadeira identidade do que se
pretendia como poema. E não que devamos esperar verossimilhança. Sei bem a
separação que deve existir entre os dois tipos de arte em foco, a literatura e
a música. Mas entendo como leigo na observação que uma vez que se pretende
criar uma arte com referências vindas de outra obra já existente, é necessário
e de bom tom o senso mínimo de que é preciso ir além da estruturação harmônica
musical para conseguir compreender a alma. E de fato, os poemas não conseguiram
solidificar-se em música e tão pouco a melodia sobre os poemas de Tobias
Barreto possuíam algo de alma.
As quatro canções acabaram sendo mais do mesmo no
palco. Ao escutá-las
não se pode compreender o lirismo romântico com que escreveu Barreto. Não se
pode perceber a saudade e a solidão como partes distintas, já que as melodias
pesadas e fortes eram figurativamente iguais de um movimento para o outro. De
modo incongruente a parecer que a obra independente de sua qualidade, já que é
um bom texto musical, não passa de uma encomenda pretensiosa referente à obra
de alguém que se quer o compositor conseguiu entender minimamente. Diferente de
quando se houve uma boa rapsódia sobre o tema sergipano do “meu papagaio”
composta pelo pianista Daniel Freire. E não só por ter sido um filho da terra a
compô-la, mas sobre tudo e fundamentalmente porque nela o pianista conseguiu
sem engodos nos revestir de sergipanidade. Ao escutá-la é clara a nossa
identificação.
Assim por dizer a cara dos músicos enfadados
no quarto movimento que contou com um solo anêmico escrito para as violas, (e que
não faz jus à condição técnica do bom naipe de violas na ORSSE), e a obviedade
enfadonha na qual a platéia mergulhou, a peça é de um tom pós-moderno
atormentado ao próprio tormento de perceber que podia passar sem ter existido.
E é claro que não repudio a idéia da encomenda musical, repudio com esse texto
o desperdício de dinheiro público investido sem nenhum tipo de supervisão
artística nesse tipo de empreendimento.
Louvores sejam dados que nem todas as coisas
foram perdidas. É justo o mérito que teve o naipe de trompas, apanhadamente bem
afinados e junto a percussão dando vazão ao preenchimento da sonoridade no
teatro Tobias Barreto. Também as cordas, que sem esforço algum conseguiram
afinar-se em meio à inexatidões de melodias que lhes podiam ser oferecidas como
luz em meio a tanto peso, tanto desespero harmônico. Resguardaram toda a
ferocidade do naipe para a brilhante execução do concerto para piano e
orquestra nº 2 do Alemão Johannes Brahms. Intercalados e mesmo com o peso das
quatro canções anteriores, ainda assim conseguiram brilhar de igual modo com o
pianista Ricardo Castro. Existia naquele conjunto muito de elaboração, de
didática e compreensão. Cada nota nua no piano, cada ataque feroz do conjunto
conseguia preencher o Teatro e com isso refletir que se havia um problema
aquela noite, esse não era por parte dos músicos e sim da escolha desconexa do
repertório. Já no sentido diretivo, o único aplauso vai para a apresentação da
obra no programa impresso do concerto. É a grande diferença entre alguém que
pesquisou com responsabilidade os traços e as singularidades da obra do poeta
ao lembrá-lo como expoente da terceira geração romântica do Brasil, o
condoreirismo, de alguém que escreve por habilidade uma obra orquestral e a
mascara como referencia de algo que sequer compreendeu.
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